terça-feira, 4 de agosto de 2009

Os Dinossauros e Deus

Por Elton Valente

Nota: este texto foi publicado originalmente no blog Geófagos em 10/01/2009. Agora, com a vinda de Dawkins ao Brasil (Pirenópolis e FLIP 2009), muito se discutiu sobre o tema, então resolvi resgatá-lo, pois estou trabalhando um texto novo sobre o assunto.

A ciência vive de idéias e fatos, a cultura universal vive de idéias e fatos. O problema surge quando os fatos são manipulados e as idéias viram dogmas. Na seqüência, vem o encabrestamento dos homens e de sua capacidade de pensar e questionar o mundo que os cerca. Quem discorda das convenções sempre enfrenta o Tribunal do Santo Ofício.

Tudo bem que se acredite no Criacionismo. O absurdo é tentar impor sua aplicação como disciplina nas escolas. Pior, às vezes ele vem como plataforma política. Vide o governo Bush (2001-2009), seus simpatizantes e alguns outros exemplos mundo afora.

Para os criacionistas Deus criou o mundo e tudo o que nele há. O relato absoluto desta epopéia é a Bíblia, escrita pelos homens, mas por inspiração e ordem expressas do Criador. Contando-se as gerações regressivas de Cristo até Adão, chega-se ao surpreendente cálculo de que o mundo, ou o universo, foi criado por Deus cerca de 5.000 a 6.000 anos atrás – estes são números oficiais. Alguns “criacionistas modernos” tentam empurrar “a data da criação” para cerca de 10.000 anos. Mas o fato é que antes disso não havia nada. “No princípio era o abismo e a escuridão” (Gênesis: 1).

Aos criacionistas uma questão simples e objetiva: por que a Bíblia não fala dos dinossauros? Ela não traz o relato absoluto, fiel e acabado da obra do Criador?

Existe uma resposta lapidar para esta questão. A pergunta e a resposta não são minhas. Tomei-as emprestadas de dois grandes amigos meus que pediram para permanecerem anônimos. Certa vez, não faz muito tempo, estávamos na casa de um deles em uma festa de fim de ano. Havíamos bebido alguma cerveja, é bom que se diga. Lá pelas tantas, um deles, o mais religioso, diga-se, questionou: — Por que a Bíblia não fala dos dinossauros, ela não deveria falar de tudo o que existe no mundo? O outro respondeu: — É porque os dinossauros são de antes de Deus!

Uma sábia resposta para uma oportuna pergunta! Gostei tanto que guardei-as em minhas anotações. E agora faço um resgate delas.

É curioso como muitas vezes é difícil enxergar o óbvio. O homem criou Deus no momento em que começou a pensar nele, criando assim o conceito de divindade. A Bíblia foi escrita depois, e muito antes do homem tomar conhecimento da existência dos Dinos, portanto eles não poderiam estar lá. Observe que você encontra na Bíblia o trigo, a uva, a oliveira, a ovelha, o camelo, a base da economia do Oriente Médio bíblico, mas não encontra o milho, a batata, o cacau, o amendoim e a lhama, produtos típicos do Novo Mundo, da América Pré-Colombiana no período equivalente. É simples, Deus na Bíblia só sabe daquilo que o homem sabia.

Enxergar o óbvio quando se trata de religião é ainda pior, fomos criados por nossos pais, pelo menos a maioria de nós, com Deus sempre presente, à espreita, vigiando, ameaçando, “vendo fazer tudo que se faz dentro do banheiro” (Raul Seixas em Paranóia), aí fica difícil para muita gente imaginar-se sem Deus, imaginar o mundo sem Deus. O medo às vezes é tanto que alguns nem cogitam pensar no assunto. E assim caminha a humanidade, em círculos, na velha caverna de Platão.

4 comentários:

  1. E não é que vc resgatou mesmo esse texto formidável?

    Abraços!

    ResponderExcluir
  2. Você sugeriu, nós acatamos!
    Obrigado pela sugestão e pelo elogio!

    ResponderExcluir
  3. Olá,Elton

    Com as minhas saudações,e a propósito deste seu texto,mas muito em especial porque refere Dawkins,com a sua permissão,atrevo-me a deixar-lhe a seguinte redacção de "menino de escola
    primária",com o título ORA BOLAS.

    http://alguresnestevale.blogspot.com/2008/11/ora-bolas.html

    Muito boa saúde e muito bom descanso.

    ResponderExcluir
  4. Prezado Manuel,

    Li o texto recomendado por você. Gostei muito! Aliás, tenho lido algumas coisas no “Algures Neste Vale” (não consigo deixar comentários) e admirado muito as imagens, principalmente as dos insetos – sou fascinado pela Entomologia Geral. Gosto muito dos textos do Algures, eu tenho uma espécie de nostalgia, de coisas não vividas, com Portugal, sobretudo pela História e pela Literatura que unem os falantes do idioma de Camões.

    Voltando ao assunto. Muitos admiradores do cientista Richard Dawkins não aprovam “o ateu combativo” que se tornou o homem. Entre estes “desaprovadores” eu me incluo.

    Postei novamente este texto, dos dinossauros, porque redigi outro texto, acho que o mais longo que já fiz, tratando ainda deste assunto. Devo postá-lo ainda nesta semana. Ele já está pronto.

    Sou de família católica, do catolicismo romano. Quando criança, cumpri com todos os sacramentos disponíveis às crianças, por obra e graça de minha querida e saudosa mãe – de quem lhe reporto com emoção.

    Com minha independência intelectual, tomei conhecimento sobre a história das religiões, comecei a questionar as lideranças, as injustiças cometidas, as brutalidades e arbitrariedades e, principalmente, numa segunda etapa do processo, comecei a questionar a espiritualidade humana, a idéia de Deus, essas coisas.

    Mas lhe digo com firmeza, defendo os princípios e os valores cristãos, que não estão necessariamente atrelados à espiritualidade. Creio que eles são fundamentais na construção de uma sociedade civilizada. Então, os “ateus combativos” geralmente não reconhecem estas questões e saem por aí “atirando a esmo”. Não concordo com isso.

    Respeito você Amigo Manuel, respeito sua fé e, tenha certeza, os valores cristãos e outras afinidades nos unem, embora eu questione o uso que a civilização faz da espiritualidade, como você verá no meu próximo texto.

    Obrigado por sua atenção, obrigado pelos elogios que você sempre me faz. Tenha certeza de que nossas “Cartas Blogueiras” me agradam bastante. Desejo muita saúde, muito sucesso e muita paz a você e todos os seus.

    Um abraço fraterno!

    ResponderExcluir